A pressão da competitividade nas crianças | Revista Crescer

A competição é uma constante nos dias de hoje. E até nos mais novos já se faz sentir a pressão da competitividade. 

A Dra. Joana Correia explica este fenómeno e de que forma pode interferir no crescimento e desenvolvimento saudável das crianças e jovens.

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" - Mãe... Mãe... tive Bom a Português! - E a Maria?"

Muitas vezes é isto que acontece quando uma criança chega a casa eufórica para partilhar com a família os seus resultados! Vai feliz, por sentir que conseguiu passar no teste e anseia contar a todos…mas quando ouve …” E a Maria?”…é como se a magia fosse embora…

Hoje muitos pais, estão pouco sensibilizados para o reforço positivo dos filhos. Desvalorizam a importância de dar os Parabéns e dizer …”Boa, estou tão orgulhosa/o de ti”… e substituem pelo comportamento mais arrasador que a criança pode sentir, que é, a comparação com os colegas. Aqui, há sempre o pensamento de que as notas dos colegas são mais importantes do que as suas próprias notas, aos olhos dos pais.

Tudo isto ao longo de 12 anos de escolaridade obrigatória, mais 5 opcionais, em constantes momentos de avaliação, o resultado acaba por ser uma baixa auto- estima, baixa auto- confiança, o pensamento de …”não sou suficientemente bom/boa para nada”…., …”os outros são sempre melhores do que eu!”… Este resultado vai ser o espelho de um adulto inseguro e muitas vezes competitivo em doses pouco saudáveis.

A autora do livro: "Quando for grande quero ser Psicóloga"

Sou autora do livro, “Quando for grande quero ser Psicóloga”, neste livro desenvolvo este tema que tanto me sensibiliza, tanto como profissional, como cidadã. Um dos meus maiores objetivos com este livro foi passar a mensagem que a competitividade pode dar lugar à cooperação. Que a competitividade tem a porção certa para ser usada.

Como questiono no meu livro, “o muito bom do meu colega de carteira, baixa o meu?”, “Se eu ajudar o meu colega, isso vai baixar a minha nota?”

Hoje em dia a competitividade e a comparação estão cada vez mais presentes nas escolas, inicia-se com frequência no Jardim de Infância e na maior parte das vezes, esta semente é colocada pelos pais/educadores ou mesmo pelos próprios colegas. Sente-se cada vez mais uma necessidade de brilhar perante tudo e todos. É um comportamento autocentrado.

Observo na minha prática clínica que as crianças sofrem pela pressão da competitividade, pela voz “oculta” de terem que ser os melhores, pela “culpa” que sentem por perceberem que os pais querem ainda mais deles, pelo turbilhão de sentimentos e emoções que para eles é tão difícil de gerir. Tudo isto dá origem a angústias, invejas, tristeza originando assim problemas na socialização infantil e de aprendizagem.

No meu mestrado, debrucei-me sobre a temática, Dificuldades de Aprendizagem. Durante a  realização  da tese, percebi  que grande parte deste “Rotulo de Dificuldades de Aprendizagem” não está relacionado com níveis de QI, como tantas vezes se pensa, estas crianças  acabam por ser rotuladas por “Meninos/as com necessidades educativas especiais” . Por detrás das dificuldades de aprendizagem, estão problemas emocionais, como angustias, bullying, problemas familiares e desmotivação para estudar, e, aqui sim, é muito importante haver intervenção e fazer um despiste  correto para evitar que crianças com problemas emocionais fiquem rotuladas indevidamente.

O amor incondicional e o o reforço positivo

Para aprendermos é importante estarmos felizes, motivados, ter o reforço positivo dos pais e  dos professores.  Saberem e sentirem que um mau resultado não é sinonimo de que não são capazes, …”porque motivo, têm e devem de ser sempre os melhores?”…

Quando uma criança sente por parte dos pais, a confiança, o reforço, segurança e como ingrediente principal o AMOR INCONDICIONAL, está pronta para todos os desafios, porque assim, temos crianças felizes, alegres, sem pressões, completamente certas de que o amor dos pais e admiração não é determinado por uma classificação escolar.

É normal que os pais façam e desejem os melhores planos para os filhos, mas é muito importante que tenham a capacidade de os conduzir para os sonhos dos filhos e não como grande parte das vezes para os sonhos que os pais não realizaram.

A semana de uma criança muitas  vezes é pior que a vida de adulto cheio de trabalho, passam horas na escola e quando saem da escola tem uma atividade por dia onde muito antes  de se divertirem está implícito mais uma vez o “aprender”, o  “ser bom”,  e eu pergunto, onde está o mais importante de tudo na infância, o Brincar?

Na infância é fundamental brincar, este é o maior estímulo das competências humanas, é aqui que se aprendem habilidades fundamentais para o futuro.

As crianças ao brincar num jardim, aprendem a negociar, interagir, ter empatia, ouvir o outro, fazer-se ouvir, a medir perigos, resolver problemas, desenvolver coragem, criatividade, imaginação…tudo isto são ingredientes fundamentais para a vida adulta.

É bom e importante uma criança errar, é bom e importante cair, sujar-se na lama, fazer cabanas e piqueniques, brincar ao faz de conta, sonharem e assim treinarem as competências fundamentais para um dia serem boas pessoas, bons profissionais e mais importante que tudo serem felizes!

Eu acredito que crianças felizes e amadas serão adultos extraordinários!